quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Infância





Como disse no post anterior, sou uma pessoa como qualquer outra, à excepção de um pequeno, grande pormenor. Nasci com uma Imunodeficiência Primária e na altura pouco ou nada se falava sobre imunodeficiências primárias em Portugal. Com um mês de vida detectaram-me uma anemia diseritropoiética congénita, em função da qual me fizeram uma transfusão, mas tanto quanto sei, a questão não foi muito além disso.

Com um ano de idade fui a Paris fazer doseamento da vitamina B12 e detectaram-me um défice de IgG. Aos dois anos fiz a primeira pneumonia, mas foi apenas aos cinco anos, após um ano de pneumonias sucessivas, das quais resultou a sequela das bronquequetasias (ou seja, o facto de ter expectoração alojada nos brônquios de forma permanente), que me diagnosticaram uma Imunodeficiência Primária. E aos seis  comecei o tratamento de reposição de imunoglobulinas por via endovenosa. No entanto, demorou alguns anos até sentir efectivamente alguma diferença com o tratamento, porque adoecia frequentemente e faltava muito às aulas, sobretudo durante a escola primária, sentia-me quase sempre cansada e correr era um suplício.

Além disso, não cresci ao ritmo normal e tive sempre peso a menos, fazia antibiótico diariamente como forma de prevenção, até que, aos nove anos, comecei a ser seguida num pneumologista. Felizmente, passei a fazer medição específica para conter a produção ou crescimento das bronquequetasias e para ajudar a limpar, afim de evitar infecções.

Parecendo que não, tudo isto marcou em demasia as minhas memórias de infância, porque aquilo que recordo melhor são os internamentos, os dias deitada na cama a vomitar e com febre, os infindáveis exames médicos, as consultas constantes, as punções (colocação de um cateter ou agulha na veia) que muitas vezes corriam mal, entre outras coisas. Também tenho memórias de coisas "normais", como por exemplo, de quando fui para o infantário, do primeiro dia de escola, das aulas de ballet, etc.,  mas algumas são tão esfumadas que mais parecem sonhos. Esta foi a fase da confusão que, comparada com a fase da adolescência, deve ter custado mais à minha mãe do que a mim.

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